Ossadas expostas em fotografia reproduzida em edição do Diário de Notícias do início da década de 1930. Hemeroteca do Museu de Comunicação Social de Porto Alegre.

“Um achado que dá margem a suspeitas”

Um casebre sinistro, uma tábua solta sobre um achado macabro… Tudo conspirava para uma reportagem de tirar o fôlego no Correio do Povo! Menos para a moradora da casa, que, comicamente, parece completamente desafetada da cena que causou “alguns estremecimentos” na assistência.

“Um achado que dá margem a suspeitas1

O que foi encontrado, hontem, sob o assoalho de um predio á rua Demetrio Ribeiro

Tratar-se-á de restos de uma ossada humana? – É o que cabe á policia averiguar

Pela manhã de hontem, muito cedo ainda, tilintara longamente a campainha do telephone da nossa redacção.

Era uma denuncia, mixto de impressionismo e de incredulidade, que nos mandava á rua Demetrio Ribeiro n. 914, onde, ao que se affirmava, existiam ossos humanos enterrados sob o assoalho.

Embora dando pouco credito ao que nos era relatado, resolvemos procurar primeiramente a policia.

Na Chefatura, onde estivemos, já o alvoroço era grande. Prepara-se uma ‘canoa’ para averiguar o que de positivo havia na denuncia anonyma.

O tenente Adalardo de Freitas e alguns investigadores rumaram, em automovel, para o predio sinistro.

Era um casebre antigo, quasi em ruinas. Uma senhora, á primeira batida, entreabriu a porta. A caravana entrou.

Começaram as pesquizas. Na sala. No quarto. Na varanda.

A dona da casa auxiliou a policia:

– Ah! Já sei… Procuram ossos?

– Sim senhora…

– É ali, sob o assoalho do quarto…

Havia, ali, uma taboa cerrada ao meio, que foi levantada. Um dos investigadores abaixou-se para remexer a terra. Houve, nos assistentes, alguns estremecimentos.

Pouco a pouco, foram apparecendo ossos, de pequeno tamanho e de diferentes feitios.

A situação complicava-se e o tenente Adalardo solicitou a presença da autoridade superior.

Pouco depois, lá estava o dr. Sensurio Cordeiro, delegado do 2º districto, actualmente respondendo pelo expediente da 1º delegacia, acompanhado do seu amanuense e de vários auxiliares.

O delegado interrogou a moradora do predio, que declarou chamar-se Maria Amelia Machado e ser casada com o sr. Francisco Maldonado, empregado na Casa Ouvidor.

Accrescentou morar naquele predio ha 3 mezes e ter sido a descobridora dos ossos.

Sentira, certa vez, uma taboa frouxa. Levantando-a, verificou que havia ossamentas escondidas. Dahi o alarma.

O delegado Sensurio ordenou nova busca e, como surpreza crescente dos circunstantes, surgiu uma machadinha, sem cabo, demonstrando ter sido utilisada muitas vezes.

Outras buscas foram dadas. Mais ossos surgiram, debaixo de toda sorte de conjecturas dos presentes.

Por ultimo, era indispensavel identi[fi]car os ossos, que se achavam sujos e de dificil constatação.

Foram, então, os mesmos cuidadosamente embrulhados e remettidos para o gabinete medico legal da Chefatura de Policia.

E emquanto a pericia não falar a verdade, continuarão as conjecturas e as mais desencontradas versões sobre os ossos encontrados no predio n. 914 da rua Demetrio Ribeiro”.

Autoria desconhecida

Referências:

1 Correio do Povo, 19/08/1930, p. 5. Arquivo Histórico Municipal de Porto Alegre Moysés Vellinho. A grafia original foi mantida.

Deixe um comentário