De volta! – post de retorno do Beco

Figura 1. O (re)começo de uma viagem contada em páginas.

Dois anos depois de ter lançado o primeiro volume do Beco do Rosário, volto com muita alegria (quase lágrimas nos olhos!!) à minha produção autorais de quadrinhos, agora para finalmente concluir esse arco que, infelizmente, ficou aberto por mais tempo que eu gostaria ou imaginava. Este texto é sobre isso: sobre produzir quadrinhos autorais, sobre hiatos, sobre equilibrar segurança financeira com criação artística. Também é sobre o privilégio de poder escolher me dedicar à representação da história local e brasileira, pois além de quadrinista, sou pesquisadora. E quanto mais pesquiso mais sei que temos muito a descobrir sobre nós mesmas.

O final de 2015 trouxe bastantes mudanças para a minha vida pessoal, e olhando para trás aquilo já me parece um outro mundo, uma outra vida. As mudanças me fizeram ter de abrir mão de várias coisas, e não foi fácil: foram dois anos em que me dediquei a trabalhos de quadrinhos para o mercado franco-belga, dois anos de muito trabalho, muito aprendizado. Mas também de prazos apertados, de intensa atividade docente e muitas alegrias no convívio com alunas e alunos queridos. Ou seja, ter que acelerar o passo para pagar as contas também me trouxe valiosas lições e preciosas amizades, e um bom reinvestimento na infra-estrutura de meu estúdio em casa: móveis, pinturas, esquipamentos… Só que nisso, o tempo ficou bem mais curto, e tive que estabelecer prioridades. Mais uma vez, o trabalho autoral teve que esperar…

Já que o tempo escasso, contratei uma assistente que virou meu braço direito: a Ana Claudia Soares está trabalhando comigo há quase dois anos. Me ajudando, como ela mesma diz, a “só ficar desenhando”! Tem sido uma experiência ótima, transformadora, que recomendo a todas e todos colegas ilustradores. Vou falar mais sobre isso em breve, mas por enquanto, fica a dica: dividir o trabalho alivia a gente, acelera a produção e ajuda a formar as novas gerações de colegas que estão aí.

Mas de volta à produção de quadrinhos autorais: não posso frisar o suficiente a importância de representar a história local e colocar histórias originais na roda, criar coisas novas numa paisagem cultural onde pululam remakes em todos os meios. E o espaço que encontramos para fazer isso continua sendo, por excelência, o da produção autoral. Os últimos dois anos de trabalho e mudanças, e principalmente de muito planejamento, me fizeram ver com ainda mais clareza o privilégio que é poder dedicar um tempo (geralmente considerável) a escrever, desenhar e pintar uma história em quadrinhos que não se insere na lógica do lucro. E, pelo que tenho visto, este é o caso para os quadrinhos que tratam das histórias locais, sobre o Brasil, sobre sua gente e suas cidades e suas memórias. Aqueles mesmos que fazem com que as pessoas daqui – e não só as que lêem quadrinhos – se identifiquem nos desenhos, nos gestos, na linguagem, nas paisagens. Tudo isso por que creio que temos, no Brasil, uma fome contida, silenciosa de representação.

É com essa ambição que retomo o trabalho agora no volume 2 do Beco do Rosário, pois acredito que faz sentido contar essa história. Faz sentido falar das mudanças das nossas cidades, como elas eram, como eram as pessoas que as habitavam, e como elas chegaram até nós. Entendo que o conhecimento do nosso próprio patrimônio histórico e cultural não está somente nos grandes monumentos e grandes figuras individuais, mas nas pessoas e construções comuns também.  Talvez, mesmo, principalmente nelas.

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Estamos trabalhando nas oficinas do Beco!

Ao contrário do que reza o senso comum, nossa história e território são muito ricos. Temos muitas memórias nas ruas, nas praças, campos e florestas de todo o país. Como autora, acho que temos muito a descobrir, muitos episódios incríveis do passado e do presente do nosso cantinho no mundo que esperam para serem interpretados, contados e recontados na linguagem atraente e convidativa das histórias em quadrinhos. Muitas coisas que nos ajudam a entender e debater quem somos, a ver o mundo ao nosso redor com um olhar renovador e inquiridor.

Enfim, que possamos, todas e todos nós, fazer ainda mais disso! Nós precisamos.

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